quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Diálogos hipotéticos (in progress)

#1

AR: - Achei que as coisas estavam indo rápidas demais. Você até me chamou de "tourinho"
BR: - Com 12 anos de Brasil vocês deveria saber que no diminutivo vive tanto o carinho quanto a ironia. 

#2

Sr. Faz doce: - Estamos em uma época de boas relações com grandes eventos. Isso será extremamente positivo para nós.
Sr. Não to a fim: - Caguei!


#3
Judeu Fake (15:49): - Sumiu de vez...
Judeu Suburbano (19:44): Sumi nada... hahahah to sempre aqui.Você que tá meio distante não sei por que. Não quer mais falar comigo, é? rs. Como que anda tudo por aê? 
JF (19:45): Eu??? Sempre quero. Estou bem. Enrolando para arrumar meu quarto hahaha
JS (21:46): Esse fim de semana, meus pais me obrigaram a pintar meu quarto porque meus amigos iam vir para cá rsrs. Hein, to namorando... (vários emoticons de apreensão). Mas, espero que possamos ser amigos, né... Você é uma pessoa super do bem. E o que aconteceu de bom por aí?
JF (23:26): Opa. Eu deixei meu celular carregando...

#4
Aprendiz de michê: - Rodrigo?
Comeu de graça: - Errou! hahahaha
ADM: - Se não quer falar bem. Não perguntarei. Não tô vendo foto.
CDG: - Relaxa. hahahhah

#5
Peruano cara de velho: - Oi BR! Boa tarde (emoticon de sorriso fofo e bochechas rosadas)
BR: (Quase 19 horas e ou ele ainda não aprendeu falar "boa noite" ou não ainda não se entendo com o sistema de 24 horas?) - Opa. Blz?
PCDV: - Tudo bem (emoticon com sorriso fofo e bochechas rosadas). E você? Como vai?
BR: - Cmg tb. Tudo bem.
PCDV: - Legal (emoticon piscando) O que fazendo (emoticon com sorriso fofo e bochechas rosadas)
BR: - Estava comendo (e não era você)
PCDV: - Certo, daqui a pouco farei o mesmo, já é hora do lanche. Eu estou assistindo um filme no computador. Rio 2 rsrs
BR: (Who's cares??????? ZZZZZZZZZZZZZZZzzZzZzz) :)
PCDV: (emoticon mandando beijos)


terça-feira, 1 de julho de 2014

Caos canônicos ou romanos


Você pegou uma garrafa de vinho tinto, aquele sobretudo comprado em uma liquidação na Via del Corso e uma maço de cigarro. Podia chover, podia fazer frio e vir caco de vidro. Estava preparada. Seus cabelos cacheados e um sotaque francês carregado. Ciao! Dito em olhares e sem nenhum som. Termina o vinho. Garrafa estardalhada no chão. Pisa com força como se fizesse um cerol para afiar seus longos saltos. Quatro lances de escadas. Uma selfie na ponte metálica. Garbatella! Você não tem medo da velocidade do metrô, não é mesmo? Aposta corrida com os vagões e sempre ganha. Duas linhas é pouco para você que vai longe. Sem medo e sem dramas.

Um beijo no namorado azul e amarelo da Praça São Pedro. É proibido. Mas, dos desvios ali é o mais puro. Não tem ambição de ser a nova Maria. Sabemos: está mais para Madah. Não há culpa, não trabalha com isso. O confessionário era para os lerdos e organizados. O pecado é absolvido no esquecimento e a sua memória é de pólvora. Segue sem rumo, sem preocupações. Compra mais uma garrafa de vinho no supermercado da estação Termini. Abastece o estoque de baseado com os colegas da marquise e ainda pechincha. Ganha uma bala de brinde para a sexta na Mucca. 

Tem dias que você se pega feliz e não se preocupa com o motivo. Uma foto com um turista olhar triste e olheiras perto da fonte da Piazza Navona. São quatro rios, mas vocês posam na frente do da Prata. Ele ri. Pede uma dele sozinho e vai embora para Trastevere. Você ficou e tomou conta dele até que ele subisse na esquina da embaixada tropical. Mais uns goles. Dois cigarros. O dia está nublado e você acha lindo.

Há momentos de muito mau humor. Dias trovoados. Num surto de raio derrubou uma saudita de burca e tudo na Fontana de Trevi. Não olhou para trás e muito menos jogou moeda. Tinha pressa e não desejos. Ela molhada saia da água cheia de moedas no véu e feliz por exibir suas curvas para tantas nacionalidades de homens. Machos! Ela se sentindo feminista e você apenas preocupada em chegar a tempo para comprar uma nova frigideira e um conjunto de pratos ou tomates secos no Campo del Fiori. Quando chegar em casa, talvez cozinhe com azeite trufado ou apenas ouça música deitada na cama. Talvez desça para um bar ou talvez chore sozinha enquanto leva a cachorra para passear.

terça-feira, 3 de junho de 2014

O drink de Veneza


Era um dos últimos a sair do restaurante. Ajudava a lavar os pratos, a recolher os cardápios e organizar de acordo com o idioma. Quando a porta metálica estava abaixada, ele tirava o colete e abria os primeiros botões da camisa. Não se importava se o gel do cabelo ainda estava fazendo efeito e se as sobrancelhas ainda estavam penteadas. Se despedia dos colegas e ia andando pelos becos segurando sua mochila. Tinha que atravessar 10 pontes até chegar a Piazza de Roma e seguir para casa.

Havia dias em que vendava os olhos e tentava acertar o caminho pelos cheiros e pelos barulhos. Se sentia mais cheiro de frutos do mar sendo cozidos é porque estava perto da Piazza San Marco e alguma coisa tinha acontecido, pois era a direção oposta. Isso dificilmente acontecia porque as vozes babilônicas e o som do tango sempre o afastava do erro. Cheiro de hambúrgueres sinalizava que não deveria ir com pressa para evitar cair no Grande Canal. Se era invadido pelo odor do Falafel, ficava feliz. O Ghetto era um dos seus lugares preferidos e sempre tentava uma vaga em algum apartamento na região.

Por conta dos horários, todo mundo achava que ele só fazia o trajeto casa-trabalho e que no máximo se divertia em alguma discoteca decadente de Mestre. Mas, ele era discreto e não falava que adorava se divertir invadindo gôndolas a noite para encontros fugazes. Muito menos que adorava deitar no chão do Campo de Santa Maria Formosa para ver nuvens. Nunca foi fã de constelações. Gargalhava Alto com algumas formas. Irônico para quem vivia em uma cidade em formato de peixe.

Nunca se atrasava, mas quando queria ganhar tempo, atravessava as feirinhas de produtos naturais e se jogava entre as Calles labirínticas como quem se move em linha reta pela laguna de Lido até a Giudecca. Chegava sempre arrumado. Tomava dois goles de Spritz que eram melhor que qualquer café expresso. Mais alguns minutos tudo estava em seu lugar e ele na porta do restaurante com sorriso na mão e ímã nos olhos. Era a isca que todo mundo queria morder.

terça-feira, 27 de maio de 2014

Florença em dois tempos


Não, não foi amor à primeira vista. Eu te olhava ali parada e senti o calor vindo junto com um vento fraco. Caminhando por aquela pista e surdo pelo barulho das turbinas. Olhei para ele também. Cabelo raspado lateral, calça jeans cintura baixa e sorriso de ruborizar qualquer cafajeste. Lugar comum. Nunca cansa. Nunca canso. Ninguém cansa. Eram tantos destinos, formas de ir e nenhuma de ficar. Uma estação no meio do vazio. Via a cidade brotando do meio das ruelas. Via para a direita. Via para a esquerda. Um terremoto e Santa Maria del Fiori nos vesga com seus detalhes. São escadas que não param de subir. Falam espanhol e entendem português. São portas que não param de se abrir. Parlam italiano. Não servem capuccino, não gostam que peçam que mude o ponto da carne e se recusam a comentar sobre molho pesto. Ele canta entre as mesas desocupadas. Joga charme para os guardanapos e para a caixa registradora. Sorri e tenta explicar sem cantar que a minha mochila estava ficando para trás. 

O carrossel joga a gente sempre para o mesmo lugar. Mas, quando se tem tempo, repetir os quarteirões é a graça do jogo. O rio Arno flui tão lento como se cada gota também quisesse se eternizar como cada edifício, pedra de rua ou ponte. A Vecchio nada mais que uma favela renascentista. Não há deboche ou heresia. Apenas não há paixão. Mama fala para ir com ela enquanto se equilibra nos saltos pretos. Todos acordam junto com o sol e esperam por Davi. Esperam pelos degraus da igreja. Temos apenas frio, preguiça e fome. Mergulhar em imenso foccaccio é a distração. Ela caminha a passos lentos e pede euros. Ganha pão, queijo e salame. A coca-cola é cara o suficiente para transformar uma possível caridade em mecenismo. O trem corta a Toscana. Prato Centrale. Desce.Sobe. Bolonha. Desce de novo. Sobe mais uma vez. E vai para o Veneto. 

***

Havia uma má vontade e nenhum desejo de voltar. O estomago não reclama em não ganhar um carbonara e brinda àquele Quarto de libra. Os óculos, os fones coloridos e bugigangas afins custam 20. A polícia chega e tudo vai para o papelão ou trouxa. A polícia vai e as bancas improvisadas reaparecem. Uma negociação e os óculos custam 5. O fone jaune c’est cinq. Amarelo também é a nova cor do rosto. Também por cinque. Pelo dobro, o tênis é vermelho. Ele tirava cada tulipa de chope como quem ordenha uma cabra premiada. O roteiro da comida já é conhecido e sabor deve ser a surpresa. Boa. A gente se perde na margem do rio e se encontra na ponte Américo Vespúcio. O vinho é servido em copos descartáveis como seu corpo e seus sentimentos. Rico, o bulldog, olha para a gente como olhar de bilheteiro de cinema de rua sobrevivente.

Um atalho na noite e a estação aparece simples. Já havia uma empatia. Cada esquina já era motivo de rir. Florença, Firenze, Florence ou Florezia. Todo mundo queria uma lasca da sua história e tantos outros em idiomas e expectativas diversas. Eu andava com meu casaco azul surrado e reverberando todas as taças e copos de vinho da noite. O carro azul passa na contramão e para. O farol chama. A buzina chama. E a curiosidade berra. Uma senhora de cabelos desgrenhados como uma peruca velha acena. Robe aberto exibindo o corpo rechonchudo massacrado pelo espartilho apertadíssimo. Um convite lingual para uma cross-aventura pela Toscana. Grazie, mas não.

sexta-feira, 23 de maio de 2014

der Feigling

Olha para essa janela e acha que essa vista é tudo? Você sabe que não. Nós sabemos que não! Cada exclamação sabe que não. Segura esse copo cheio de vodka com gelo e fica hipnotizado pelo barulho das pedras batendo umas contra as outras. Tudo vai derreter e você vai ser obrigado a aguentar o silêncio. Vai torcer para um carro passar em alta velocidade ou um mendigo encachaçado gritar e quebrar garrafas pela rua. Vai ter que ouvir a minha voz gritando bem dentro do seu ouvido. “Covarde!”.  Só vou precisar falar uma vez e depois co var de vai ecoar dentro da sua cabeça. E será a sua voz que vai te perturbar.  Sua risada sarcástica vai arranhar seus tímpanos e vai te deixar louco como se uma abelha tivesse entrado por sua orelha.  E depois de mais um tempo essa abelha vai começar a se multiplicar e logo uma colmeia zumbindo e berrando: COVARDE!  A abelha-rainha logo  começará a se alimentar de cada um dos seus neurônios. O zangão dos seus sentimentos. As operárias vão querer devorar seu corpo inteiro por dentro. Ferrões vão brotar no lugar dos seus pelos. Ninguém vai mais poder te tocar. Eu não vou mais. E nem você mesmo vai conseguir encostar sem arder.  Sabemos que logo chorará de raiva, depois de tristeza, de revolta e depois de arrependimento. Suas lágrimas serão de mel e logo ficará todo lambuzado. Vai atrair vespas rivais e sua pele melada vai virar um campo de batalha. Só te restará ficar paralisado, sozinho, no meio de um parque frio e com árvores sem folhas.  Vai sentir saudade da minha voz e nessa hora, eu continuarei mudo.


sábado, 5 de abril de 2014

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

O Jogo

Ela pensava que era um jogo sem regras. Achava interessante a idéia jogar por jogar e ainda ganhar no final. Achava que tudo seria como uma grande corrida em um descampado plano ao vento. Se imaginava de cabelos soltos e deixando tudo fluir de maneira livre. A graça e o objetivo do jogo era esse: liberdade. Quando o que se poderia chamar de partida começou, ela percebeu que havia regras. Muitas regras. E que elas iam surgindo e mudando à medida que ela jogava. Não jogava sozinha, obviamente. Ela percebeu que a liberdade até poderia existir mas no lugar de uma planície, um misto terreno arenoso acidentado. Não era possível sair correndo ao acaso. Era preciso entender cada nova regra e a sua conseqüência. Assim, tudo foi sendo feito.

Conheceu aquela linda uruguaia na saída do metrô do Flamengo. Uma espécie de esbarrão. Lucia preferia dizer que elas se chocaram. Como duas placas tectônicas. Os efeitos ainda estão sendo medidos, mas por dias elas sentiram um terremoto dentro de seus peitos. Lucia falava um português tão peculiar que sempre chamava a atenção dos interlocutores. Não era uma questão de sotaque. Era a construção das frases e a velocidade com que pronunciava  as palavras. Representava no tempo o sentido do que queria dizer. Para Lúcia, tinha lógica, é claro. E depois de uma semana juntas, Mélia passou a falar do mesmo jeito.

O primeiro passo de Mélia, durante o jogo, foi olhar para os olhos de Lúcia de uma maneira que em instantes ela estivesse percorrendo a mente da outra. Lúcia deveria apenas se manter calada e jamais fugir o olhar. Essa talvez tenha sido a primeira regra a ser criada.  Mélia caminhava pelos pensamentos da uruguaia com o cuidado de não derrubar nada. Não que fosse proibido o passeio lá dentro, entretanto Mélia deveria sair da mesma maneira que entrou. Quando fechou os olhos e cortou a conexão com Lúcia, conheceu uma nova regra: deveria agir como se não tivesse visto nada e como se não soubesse dos traumas, medos e, sobretudo as mentiras de Lúcia. As descobertas não eram para ser esquecidas, mas deveria ser ignoradas como um bibelô barato que insiste em enfeiar a sala de estar. Por algum motivo ele precisa ficar ali na estante, gostando dele ou não.

Mélia era carioca. Não achava que isso determinava nada na sua vida além de um gentílico a ser preenchido em alguma ficha cadastral. Mesmo antes de conhecer Lúcia, ela não chiava nos esses e nos xis. O erre era sutil, porém com uma pronúncia arredondada com uma bola de bilhar. Seu cabelo parecia estar sempre impecável, como se ela gastasse horas o deixando daquela maneira. E ela realmente gastava. Dormindo. Ao acordar, tudo pronto e ela só se preocuparia em escovar os dentes. Tão brancos.

A intensidade que Lúcia iria morder Mélia era ilimitada. Se os caninos encontrassem com os ossos da carioca era prudente não avançar, mas ela poderia seguir se tivesse forças. Mélia poderia gritar desde que houvesse oscilação no tom e os intervalos de respiração não fossem mais fortes e demorados que meio centímetro de mordida. O tempo era medido com uma régua.  Antes que possa parecer, não era um joguete sádico. Primeiro porque não trabalhavam com o conceito de dor – talvez nem com o de prazer – e porque as duas tinham pavor de couro, máscaras ou chicotes (por certo, tinham uma visão primaria da prática sado-maso).

Descrever as regras, consequências e as implicações do jogo seria uma bobagem. Seria cansativo e seguramente ao fim da listagem, o jogo teria outras novas. Seria fácil classificar com um jogo que muda toda a hora. Mas, nem hora ele tinha e na impossibilidade de fixação, havia a impossibilidade de se falar em mudança. Uma vez iniciado, não tinha volta – a última regra a ser conhecida. O término era de uma sutileza tão complicada, tão minimalista que podia ser bem árida. O jogo acabava quando tinha que acabar, mas perceber um fim fazia também parte dele.


Mélia e Lúcia sabiam disso.  Ignorar era preciso. Até o dia em que Mélia levou Lúcia até a mesma estação de metrô que se conheceram e juntas desceram até a plataforma de embarque sentido Zona Norte. Lúcia olhou para Mélia e sorriu. Esperaram o metrô para a Saens Peña que só passou depois de cinco rumo a Pavuna. Quando o letreiro informou que o próximo era finalmente o que elas queriam, Mélia comemorou. Foram  caminhando para a parte do meio da plataforma. O barulho do trem ia tomando conta da estação enquanto ele ia se aproximando. As luzes no fim da galeria iam surgindo. Lucia sorriu mais uma vez. E Mélia a empurrou forte nos trilhos antes que pudesse perceber que era mais um metrô sentido Pavuna.