Tinha um pequeno jardim na entrada de casa. Vasos
de vários tamanhos com flores, hortaliças e plantas apenas verdes. Pendurados na
parede, no chão ou em cima da mesinha que usava para tomar sol nos dias
quentes. Os galhos das plantas maiores se espalhavam por todos os lados e
formavam esculturas que mudavam de acordo com o vento e a chuva. Tinha dia que
pareciam monstros cheios de tentáculos ramificados. Por vezes, ganhavam a aparência
de anjos de presépio. Mas, às vezes apenas secavam. Iam perdendo as folhas e
tombando como um corpo sem ossos. Na queda, puxavam as flores dos vasos
menores, quebravam as hortaliças e por fim, ficavam cinza. O piso xadrez do
chão sumia e quem nele pisasse ouviria o som de creque-creque da madeira seca. Se
tivesse descalço, espinhos e farpas entrariam rasgando pela sola do pé. O sangue
não jorraria. Seria sugado pelos galhos. Aos poucos uma ou outra folhinha verde
começaria a nascer. Os vegetais iriam voltando a ganhar suas formas originais. Quanto
mais sangue, mais beleza floral. Até orquídeas selvagens surgiam. Até o fim da transfusão
de alma, o pátio ficaria como uma pequena mata fechada. Diversos tons de verde,
cores e cores das flores e frutos. Algumas borboletas começavam a chegar. Pássaros
pequenos, tartarugas e macacos dourados.
Quando já não restasse mais sangue, tudo já estaria tão exuberante e o
sistema estabelecido. Aos poucos a clorofila iria entrar pelas artérias do pé e
sumindo pelas pernas até chegar ao coração. Aos pouco o vermelho seria substituído
pelo verde. Violetas surgiriam das pontas dos dedos e de dentro da orelha saíram
flores de maracujá. Girassóis dos olhos, os pelos virariam alecrins e da boca
sairia um último grito. Começava mais uma primavera.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Um comentário:
Bem, meu primeiro comentário tinha ficado fabuloso (rsrsrs). Léo, o texto é lindo, retrata uma feliz primavera, e uma primavera sombria de vida. Fico satisfeita de ter acesso a esta bela composição. Parabéns, acho que se superou! Um último grito da primavera primeira.
E o Naif para sempre nós! Beijoss
Postar um comentário